“— Diga-nos por que você quer ser ator.
— Quero ser visto — disse Stanley. — Na verdade não tenho uma resposta maior do que essa. Só quero ser visto.
— Por quê? — perguntou o professor titular de Metodologia do Ator, sua caneta-tinteiro pairando sobre o papel.
Stanley disse:
— Porque se alguém está olhando, você sabe que vale alguma coisa”.{Eleanor Catton, em ‘O ensaio’}
Christian Dunker, no documentário Nunca me sonharam, diz que nossos jovens vivem hoje um processo de encurtamento dos sonhos. Segundo o psicanalista, grande parte das nossas crianças e adolescentes vive em situação de vulnerabilidade social. Por isso, em vez de brincar e sonhar com o futuro, suas mentes se ocupam da sobrevivência, do dinheiro para ajudar em casa no final do mês, ou então para comprar suas próprias coisas, como um tênis de marca ou um celular da maçãzinha (se você quer, eles também!).
Faz sentido.
É claro que faz.
Há um apagamento de perspectivas, um apequenamento de horizontes. Há um imediatismo, uma necessidade de carpe diem que não nos permite pensar no amanhã. É tudo tão incerto….
Mas, para mim, há mais aqui.
Há um apagamento de sujeitos também.
No ano passado, numa das disciplinas que eu ministrava, Culturas Digitais, fiz uma enquete com os meus alunos. 100% deles responderam que desejavam se tornar famosos. 98% sem nem saber pelo quê.
No TikTok, eles vislumbram não só a possibilidade de uma ascensão meteórica e, muitas vezes, injustificada. Eles não veem só os milhões de seguidores, as publis e os recebidos. Não. Eles veem também pessoas sendo vistas.
Eles precisam de celulares caros, precisam ajudar a família, precisam fazer dancinhas e ficar famosos, sim. Mas eles precisam, sobretudo, de alguém que olhe para eles.
“Tudo no mundo só quer ser amado. A gente canta e dança, faz careta e dá buquê de rosa, tentando ser amado. Você já reparou que as árvore fazem tudo que a gente faz pra chamar atenção, menos andar?!”
{Alice Walker, em ‘A cor púrpura’}
Eu já estive nesse lugar. Eu sei o que é querer empatia, pedir amor, mas só ganhar incompreensão dentro de casa. O único lugar em que eu era visto, era reconhecido, celebrado e elogiado até, adivinhem só qual era…
A escola.
Foi na escola que eu fui visto pela primeira vez. Foram minhas professoras quem disseram que eu valia alguma coisa, que meus textos eram bons, que eu sabia desenhar, que era querido e muito bem comportado.
Foi na escola que eu recebi escuta, carinho, compreensão, olhar.
Em casa?! Melhor nem pensar.
Hoje, eu começo na escola nova com as aulas propriamente ditas.
Hoje, eu entro nas minhas primeiras turmas, eu olho nos olhos dessa geração de sonhos encurtados, de perspectivas encolhidas, de horizontes acachapados. E eu vejo eles ali. Porque não basta abrir os olhos, é preciso abrir o olhar.
Quando se abre, você pode ver as potencialidades, os corações vibrando, o brilho que vem nos olhos deles quando a Literatura entra no peito e faz ele bater descompassado.
Eu olho e me vejo ali.
Por isso, com olhos abertos e o coração atento, eu entro nas salas de aula, não apenas como professor, mas como guardião de sementes. Cada aluno é um universo de sonhos, anseios e potencialidades, esperando ser visto, compreendido e celebrado.
Nossos olhares não são meros observadores; são lentes que captam a luz da esperança e a refletem. Quando olhamos para alguém, não deveríamos enxergar apenas um rosto, mas uma história em construção. As palavras que pronunciamos ecoam além do quadro-negro, moldam futuros. Nosso olhar ilumina caminhos.
Por isso, meu desafio para você esta semana é abrir o olhar.
Comece a enxergar quem está à sua volta, mas de verdade. Não com as suas lentes cansadas, não com as suas expectativas usadas e suas formas gastas. Abra o olhar! Talvez, nesse caminho, você descubra que quem você mais ama estava só esperando uma chance para se ver assim: refletido no brilho dos seus olhos.
🎙️ Quem houve a voz do outro?
💔 Você já ouviu falar em apagão da intimidade?
😅 O que deixamos de ouvir fala cada coisa....
📖 Quero fazer um desses!
🎨 Hora de relaxar e brincar com cores nesse construtor de backgrounds.
E se você gosta do meu trabalho e quer apoiá-lo, você pode:
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Bombou no Insta esta semana:
Linné, que alegria ler suas palavras. Não esquecer quem fomos e ser tal como aquela pessoa que nos inspirou/amparou é passar adiante o que recebemos! Inspirar, descobrir talentos, sonhar junto com os alunos é algo nos alimenta, nos amadurece, dá sentido ao labor educativo. Pude fazer um pouco de tudo isso nos tempos da militância na educação. Sempre bom relembrar!
Viajei para a minha época de escola. Lembrei das falas ruins que me marcaram e também do meu professor de literatura que acreditou na minha escrita. E hoje essa eacrita me ajuda a caminhar pela vida!