"Eu não havia percebido por quanto tempo estava morta.
E isso me lembra uma história: nela, havia uma linda e jovem pantera, que possuía uma coesposa e um marido. Seu nome era Lara e ela era infeliz. Especialmente porque seu marido e sua coesposa estavam realmente apaixonados um pelo outro. O fato de a tratarem com gentileza era uma mera obrigação imposta pela comunidade das panteras.
Ela era uma fêmea sobressalente no grupo, não havia outro lugar para si.
Eles nem sequer procuravam integrá-la à relação como uma coesposa, uma vez que eram perfeitamente felizes sozinhos. Algumas vezes, seu marido cheirava seu hálito e outras emanações. Até mesmo, de vez em quando, fazia amor com ela. Mas cada vez que isso acontecia, sua outra esposa, de nome Lala, ficava entristecida. Então, ela e o marido, Baba, discutiam, brigavam, rosnavam e se mordiam, batiam um nos olhos do outro com suas caudas. Não demorava muito, porém, para que se cansassem disso e voltassem a se deitar juntos, lambendo entre lágrimas as patas um do outro.
— Espera-se que eu faça amor com ela, — Baba poderia dizer para Lala, sua alma gêmea. — Ela é minha esposa tanto quanto você. Eu não planejei as coisas dessa maneira. Esse é o arranjo que me coube.
— Eu sei isso, meu querido, — diria Lala, entre lágrimas. — E essa dor é o que coube a mim. Como poderia ser de outra forma?
Os dois sentados em uma pedra na floresta, sentindo-se miseráveis juntos. Mas Lara, a inconveniente, agora grávida e doente, sentia-se devastada sozinha. Todo mundo sabia que ela não era amada e nenhuma outra pantera queria dividir seu marido com ela. Depois de algum tempo, a única voz que ela passou a ouvir foi sua voz interior:
— Lara, — ela disse, — sente-se aqui, onde o sol pode beijar você.
E ela se sentou.
— Lara, — ela disse, — deite-se aqui, onde a lua pode fazer amor com você durante toda a noite.
E ela se deitou.
— Lara, — a voz disse em uma manhã brilhante, quando ela sentia-se bem beijada e bem-amada, — sente-se aqui, nesta pedra, e olhe para o seu belo reflexo na água corrente.
Calmamente, guiada por sua voz interior, Lara sentou-se na pedra e olhou para a água. Ela observou, então, seu pequeno focinho de berinjela, suas delicadas orelhas pontudas, seu elegante e lustroso pelo negro. Ela era linda! E ela havia sido beijada pelo sol e amada pela lua.
Pelo resto do dia, Lara estava contente. Quando sua coesposa perguntou porque ela estava sorrindo, Lara não respondeu. Só alargou o seu sorriso. A pobre coesposa correu tremendo até o marido e o arrastou para ver o que havia com Lara.
Quando Baba a viu sorrir, a bem beijada e bem-amada Lara, é claro que ele não conseguiu se segurar, mal pôde esperar para colocar suas patas sobre ela. Ele podia jurar que ela estava apaixonada por alguém e isso reascendeu o seu amor.
Enquanto Lala chorava, Baba possuía Lara, que olhava distraída para a lua por sobre seus ombros.
A cada dia que passava, Lara pensava mais que somente aquela outra Lara, no espelho das águas, é que merecia possuí-la. Ela era tão linda, tão bem beijada e tão amada também. Sua voz interior a garantia que ela tinha razão.
Então, em um dia quente, quando não aguentava mais os gritos e chiados de Baba e Lala, tentando ferir um ao outro por causa dela, Lara, que agora vivia indiferente aos dois, desceu e beijou seu sereno reflexo no espelho das águas, prolongando este beijo por todo caminho, até o fundo do lago."
{Alice Walker, em 'Possessing the Secret of Joy'}
Você aprendeu a se amar direito?
Porque eu não aprendi.
O que eu aprendi foi a comparar o que via do outro lado do espelho com quem era mais bonito, mais inteligente e mais capaz do que eu. Ou seja, qualquer um.
O que eu aprendi foi a me odiar e, por isso mesmo, me machucar muito por dentro.
Olhando meus arquivos antigos, encontrei algo curioso esta semana: um vídeo que veio antes do meu perfil no Instagram fazer sucesso, antes de eu saber encarar uma câmera com desinibição e vontade. Antes de eu me sentir como me sinto hoje.
Um vídeo, enfim, em que eu tentava repetir para mim mesmo um mantra, ensinado por uma hipnoterapeuta famosa: “Eu sou suficiente! Eu sou suficiente! Eu sou suficiente!”.
Minha intenção, na época, era fazer um vídeo desses por dia, até conseguir me convencer daquilo.
Mas ali, no primeiro e único, estão os estilhaços todos do projeto.
Minha mandíbula está tão travada, que as palavras saem doídas, aos cacos.
Cacos que me machucavam com a inverdade daquilo.
Meu olhar, hoje, me desperta pena.
Pela mistura de incompreensão e constrangimento.
Não, eu não era suficiente ali.
Não era mesmo.
E poderia repetir o mantra que fosse, daqui até a Lua, que nada mudaria isso.
Não porque eu não fosse magro o bastante, alto o bastante, bonito o bastante…
Mas simplesmente porque eu não conseguia nem me suportar, quanto mais gostar de mim.
Autoestima, para aquele Vinícius do vídeo, era fazer um esforço tremendo para mudar tudo o que me desagradava. Era uma reconstrução estrutural mesmo, coitado.
Ele precisou andar muito para chegar até aqui, onde estou agora.
Não foi um trajeto linear, nem fácil de se explicar.
Mas assim como a pantera do texto, eu também precisei ouvir minha voz interior. Eu precisei entender, em algum ponto do caminho, que autoestima é poder se olhar sem culpa e sem medo.
É poder abraçar as próprias qualidades, sim, mas os defeitos também.
Isso é se sentir o suficiente. Isso é se construir e se desejar.
E é nesse desejar-se que mora a maravilha. Quem já experimentou sabe. Essa aura que faz as outras panteras enlouquecerem por Lara; esse carisma que torna você, de repente, interessante para os outros, vem de dentro.
Ouvi esta semana:
“O nosso desejo é o desejo do outro.
Todo mundo quer, na verdade, o que o outro quer”.
Imediatamente pensei: é isso!
Quando você se quer bem, você passa a ser querido.
Quando você se ama, o outro te ama.
Porque é tão raro isso: alguém querer bem a si mesmo, que logo o mundo se dobra.
E daí outro segredo, mais profundo e mais intenso, vem: nesse ponto, você, que lutou por aprovação a vida inteira, que esperou tanto por validação, aceitação, que implorou pelo amor alheio e até se humilhou por ele, já não se importa mais com isso.
Porque todo amor, respeito, carinho e admiração de que você precisa já estão aí: por dentro.
🗒 Esse é pra assistir toda manhã, antes de ir pra vida.
⚗️ Fica a dica de um site útil e curioso.
😍 Olha só o que é possível fazer com papel, caneta, tesoura e cola.
👀 Desenhando (e pintando), quem sabe a gente entende.
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Amei, muito.