“– Alguma vez perdeste alguém de quem gostavas?
– Várias vezes.
– Então, agora estás sozinho?
– Não – respondi, passando os dedos pela corda de náilon.– Neste mundo nunca se está completamente sozinho. De uma forma ou de outra, todos estamos unidos. Chove, os pássaros cantam. Rasgam-te as tripas e uma moça te beija no escuro".{Haruki Murakami, em ‘O impiedoso País das Maravilhas e o Fim do Mundo’}
Sobrevivemos, é bem verdade.
Sobrevivemos a pandemias, desastres pessoais, políticos, climáticos e tecnológicos.
Sobrevivemos a perdas, ataques terroristas, guerras e assaltos.
Sobrevivemos, não sem dores, até à desilusão de tudo.
Mas qual foi a consequência?!
A principal, talvez, seja nossa necessidade constante de nos lembrarmos de que a felicidade existe. De que a vida ainda vale a pena.
Ainda há felicidades possíveis, eu juro.
Você consegue acreditar nisso hoje? Assim, numa segunda-feira de manhã?!
Ou você precisa da sexta-feira de tarde para isso? Precisa das férias, precisa da promessa de felicidades futuras…
Pois é, meu amor, nos tornamos caçadores de momentos. A felicidade, essa fera rara, passou a ser perseguida com ardor e desespero. Aprendemos a valorizar o efêmero, o sorriso passageiro, o abraço que se desfaz. Aprendemos que cada segundo de alegria é um troféu na batalha contra o caos.
E assim, seguimos. Seguimos porque a esperança é teimosa. Ela se recusa a morrer nas trincheiras do cotidiano. Ela nos faz levantar na segunda-feira, com a promessa de que, talvez, na próxima esquina, sob o próximo sorriso, encontremos aquilo que tanto buscamos.
Seguimos porque somos humanos. E ser humano é resistir. É encontrar beleza na tempestade, é dançar na chuva, é cantar para calar o estrondo dos trovões. É beijar no escuro, é rir quando tudo pede para chorar.
Então, sim, eu preciso me lembrar de acreditar. Acreditar nas felicidades possíveis de uma segunda-feira de manhã. Porque a felicidade não espera o fim de semana. Ela se esconde nos pequenos gestos, nas palavras gentis, na música que toca ao longe. Ela está lá, na poesia que nasce do caos, esperando ser descoberta.
E ela nasce na gata que se aconchega no meu colo e ronrona, indiferente à pressão do meu trabalho. Ela nasce na réstia de sol que agora já quase, quase bate na minha estante, anunciando que o verão vem aí. Ela nasce na concentração com que a minha filha faz pulseiras, enfileirando os berloques coloridos de uma infância que evanesce. Ela nasce da nostalgia dos meus velhos cadernos e da esperança dos projetos novos.
A gente só precisa aprender a percebê-la.
Aprender que a vida é um dom por si. Que sempre haverá alguém se apaixonando, alguém dançando sozinho, alguém escrevendo poemas de amor, alguém decorando canções e escrevendo nas paredes, como você fez um dia.
É preciso não esquecer o lado bom, apesar de tudo.
Porque foi por ele e para ele que sobrevivemos.
É por isso que seguimos, você lembra ainda?!
Seguimos porque a vida é movimento. É o café que fumega na mesa, é a conversa despretensiosa com um estranho, é a risada que escapa sem permissão. É o livro que nos transporta para mundos impossíveis, é o filme que nos faz chorar e sonhar ao mesmo tempo.
Seguimos porque a felicidade é rebelde. Ela não se deixa aprisionar pelas convenções, não se limita aos finais de semana ou às datas marcadas no calendário. Ela é o improviso, o inesperado, o súbito calor de um abraço que diz “estou aqui”.
Seguimos porque cada momento é precioso. Porque cada lágrima derramada é um lembrete da nossa capacidade de sentir. Porque cada sorriso compartilhado é uma ponte entre almas. Porque cada palavra de conforto é um sussurro de esperança.
E assim, meu amor, seguimos. Porque a felicidade é uma arte, e nós somos os artistas. Ela é a tinta, o pincel, a tela. Ela é a música, a dança, a poesia. Ela é tudo o que há de bom, apesar de tudo. E é por ela, e para ela, que continuamos a sobreviver.
☀️ Boa parte da inspiração de hoje veio do primeiro encontro do CineClube da Seiva, cuja obra discutida foi o sensacional Dias Perfeitos.
🦜 Ouvir Aline Valek sempre me ensina e faz pensar. Neste episódio, me lembrei de Saramago: só conhece a ilha quem sai da ilha.
🌿 Passaria horas vendo isso.
😲 Não faria, mas recomendo. Inspirador é.
🚨 Para todos nós que transformamos paixão em ocupação…
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Bombou no Insta esta semana:
essa coisa de seguir, dia após dia, na esperança de encontrar a beleza naquilo que há de mais cotidiano, é tão bonita. adoro ler textos que falem sobre isso e me lembrem disso! obrigada por escrever, porque eu precisava ouvir. <3
sem acreditar que a felicidade virá, a gente nem levantaria da cama…