"Escreva e desenhe e construa e toque e dance e viva como só você pode. O momento em que, hipoteticamente, você sente que está andando nu pela rua, expondo demais o coração, a alma e tudo que existe lá dentro, mostrando demais de si mesmo. Esse é o momento em que, talvez, você esteja começando a acertar".
{Neil Gaiman, em 'Arte importa: porque sua imaginação pode mudar o mundo'}
Ela é uma das pessoas mais competentes que eu conheço (fato!).
Eu sou uma das pessoas mais competentes que ela conhece (mito?).
Mas sempre que conversamos, o assunto é o mesmo: o fato da nossa vida ser uma bagunça. Por que, hein?!
— Sabe que às vezes eu acho uma sacanagem eu ter que ser do jeito que eu sou?!
— Você não tem que ser. Você pode ser de outro jeito, se quiser.
— Você pensa que eu não tento, meu amor?! Eu tento o tempo todo! Por isso que a minha vida é tão difícil. Como uma luta constante, sabe?!
— Sei, de você contra você.
— Exatamente! Sou eu, aliada a mim mesma, contra mim, entendeu?! Sempre ali me puxando o tapete, me puxando o tapete...{Vani e Rui, em ‘Os normais’.}
Cada um de nós, sozinho, daria um jeito no mundo, entende?! Porque nós temos as respostas. Sabemos dar conselhos, resolver problemas, tratar de questões inteiras, por complexas que sejam.
Desde que elas não sejam nossas, claro.
Porque, se forem, daí, meu bem, enfiamos os pés pelas mãos e vira tudo um Deus nos salve. Com você é assim também? Ou você é daquelas pessoas que já tem a lista de metas para 2023 toda organizada, pensada e passada a limpo?
Porque nós não somos.
Nós nem sabemos o que queremos ser ou fazer no próximo mês.
Na última conversa com essa amiga, chegamos à conclusão de que são estes os nossos problemas: a falta de metas e o excesso de inconsistência.
Ontem à noite, depois de escrever e descartar três rascunhos dessa newsletter, eu fui ler o livro do Neil Gaiman, para me inspirar um pouco. A obra é cheia de ilustrações e ideias bonitas sobre a arte e o quanto ela importa. Num determinado momento, Gaiman escreve que passou a ver seu objetivo (ser escritor!) como uma montanha.
A partir daí, podia pensar se cada pequeno passo o levaria para mais longe, ou para mais perto da montanha.
Eu tento fazer o mesmo. De vez em quando eu tento, juro. Vejo lá a montanha! Ok. Traço a rota até ela. Imagino meus passos. Passo a noite acordado, até, tecendo planos.
Mas… na manhã seguinte… eu acordo… e tem neblina para todo lado. E, nossa, o que é aquilo? Um passarinho!? Vou atrás do passarinho. Vejo então um documentário sobre a capacidade dos passarinhos de ver as cores que nós não vemos. Desenho um arco-íris por isso. Pinto de aquarela. Faço um curso de pintura, outro de radiestesia e um terceiro sobre como beber mais água. Decido aplicar meus conhecimentos e vou à geladeira pegar água. No caminho, esqueço do que fui fazer.
Leio um livro, então.
Que fala sobre escalar montanhas.
AH É! A MONTANHA!
Daí já me deprimo porque esqueci dela e de mim.
E então eu durmo uma tarde inteira.
Assim passa um ano. E dois. Depois três.
Cinco, quem sabe. Uma vida.
E eu não quero que passe. Não assim.
Eu não quero esquecer da montanha. E de mim.
Isso porque eu sei que poderia escalar tudo até lá em cima, fincar bandeira. Mas, para isso, eu preciso me despir inteiro. Eu preciso tirar de mim a minha insegurança, meu senso crítico, minha voz ecoada sempre dizendo que está tudo errado, que eu deveria tentar de outro jeito, outra coisa, de outro modo. Eu preciso não ter vergonha de mostrar meu coração, minha alma inteira, eu mesmo.
Hoje eu fiz isso, aqui, nessa news.
Espero que amanhã eu consiga de novo.
Se o Neil Gaiman está certo, esse ainda é só o começo. E uma voz em mim já se apressa em dizer que não temos tempo de (re)começar. Mas, quer saber, tempo é tudo que temos. E hoje ainda é segunda.
💃 Primeiro a gente se joga, depois a gente pensa desse jeito. Combinado?!
🌇 Esse vídeo você ainda ver por aí esta semana.
🌊 Esse não, mas é lindo!
🎍A propósito, a beleza vem de cada coisa, hein?!
Menino, eu leio isso "Eu preciso tirar de mim a minha insegurança, meu senso crítico, minha voz ecoada sempre dizendo que está tudo errado, que eu deveria tentar de outro jeito, outra coisa, de outro modo." e penso que descreve muito bem vários pensamentos que me acompanham.
Ocorre de pensar outras coisas também e fiquei com vontade de compartilhar contigo. Por muito tempo considerei vilã essa voz que me instiga a desistir, mas de uns tempos pra cá resolvi pensar comigo que talvez seja uma voz que quer meu bem, mesmo que desalinhada com o que outras vozes e quererem movem aqui por dentro. E se ela quer meu bem, escuto, agradeço e às vezes escrevo textos dando forma ao que ela diz, para então tentar voltar o percurso rumo à montanha (metáfora que não conhecia e adorei, inclusive). Nem sempre funciona ou me faz bem, mas volta e meia alivia um pouco da pressão interna 😊
Adoro quando chega uma newsletter nova sua. Sempre um afago, um respiro. Obrigado! (comprei a zine! bjs)