“Penso que é preciso escolher a própria linha de conduta na vida, afirmá-la perante nós mesmos e perante os outros, e depois esquecer aqueles gestos, aquelas ações que contrastam com ela".
{Alba de Céspedes, em “Caderno Proibido”}
— Professor, professor! Procurei teu nome no Google…
— Cara, eu fico lisonjeado… Mas eu consigo imaginar vários assuntos bem mais interessantes para ocupar o teu tempo na internet… Se quiser, eu até recomendo alguns temas de redação que…
— Sabia que tem várias fotos tuas lá?!
Não foi o que ele disse, na porta da escola, enquanto eu tentava sair e ele bloqueava o meu caminho. Foi como ele disse. Foi o tom. Foi o olhar. Foi a risadinha mal contida.
Nada disso é novo para mim.
A novidade é quão pouco eu me importo agora.
Eu sei que ele não estava falando das fotos do meu Instagram. Nem das frases bobas que não sei quem transformou em imagens com citações. Não. Ele não estava falando sobre registros de trabalhos escolares que ganharam destaque. Tampouco sobre o obituário do meu pai, que aparece também.
Nada disso.
Naquele momento, tudo nele era preparado para me embaraçar.
Tudo nele era feito para que eu soubesse que ele estava falando de algumas fotos específicas, em que eu tenho 12 anos a menos, 22 quilos a mais e uma franja. Por Deus, uma franja! Resultado do horror que eu tinha do apelido que me deram no Ensino Fundamental, por meu cabelo ser armado demais: altas ondas - e da minha tentativa de domá-lo, puxando-o para frente.
Eu cresci refém da vergonha.
Eu cresci tentando não chamar a atenção.
Eu cresci querendo ora me adequar, ora desaparecer.
Eu cresci ouvindo aquele tom e os risos de deboche.
Eu cresci vendo aqueles olhares, lendo aqueles sinais.
Não mais, meu amor!
Se essa conversa tivesse acontecido há alguns anos, com uma das minhas versões anteriores, ele teria conseguido seu intuito. Eu teria ficado constrangidíssimo, pensando em como tirar essas fotos do ar. Como impedir que mais alguém as visse, ou que ele as usasse como figurinha de WhatsApp, ou sabe-se Deus o quê.
Mas, para o azar dele, eu já escolhi não me importar.
— Sim eu sei. Sei que tem fotos minhas na internet. E daí?!
— E daí que eu vi!
— Pois é. Elas são públicas, você tem olhos… E?!…
— E… Nada. Nada não, Sor.
Pronto. Zero drama.
Quinta-feira que segue.
Segue porque eu não tenho vergonha de quem eu sou.
Eu não tenho vergonha de quem eu fui.
Meu único constrangimento, se é que há algum, é por ter me sentido inadequado por tempo demais. Hoje, eu sei do meu valor, das minhas qualidades - e dos meus defeitos também, lógico. Paciência com eles, faço o que posso.
Hoje, eu reconheço quem sou e olho com carinho para quem fui. Dá trabalho fazer isso, eu sei. Exige complacência. Mas exige, ainda mais, uma escolha, uma tomada de decisão.
E eu decidi não deixar ninguém me envergonhar.
Eu decidi não tentar o impossível: mudar o que os outros pensam sobre mim. Ou pior: o que eu penso que os outros pensam sobre mim. Temos uma quantidade de energia limitada por dia. E eu prefiro usá-la com o que eu posso controlar. Com a minha escrita, com os meus livros, com quem eu amo e com quem me ama também.
Nós precisamos escolher bem nossas batalhas.
E depois honrá-las! Com tantos inimigos fora: a ignorância, a indiferença, a desigualdade, o preconceito, a injustiça, o medo, o ódio, o rancor, por que você ainda insiste em brigar consigo mesmo?!
Se deixe ser, por favor!
Eu me acolhi como um pai acolhe a um filho. Apesar de tudo. Apesar até da franja, que me deixava a cara do Peter Griffin, de My Family Guy.
Eu me acolhi porque percebi que era o único capaz de fazê-lo.
De verdade. Não importa o quanto os outros falem do seu valor, da sua importância, da sua necessidade de se valorizar... Não importa. Enquanto VOCÊ não fizer isso, nada vai acontecer.
Enquanto você não escolher a si mesmo e não agir de acordo, você vai continuar permitindo que os outros definam quem você é como deve se sentir a respeito.
Diante do embaraço do aluno que tentava me envergonhar, eu sorri e segui minha vida. Segui porque eu sei de algo que ele não sabe: que eu amo aquele cara das fotos. Amo tudo nele: da franja à papada, da vergonha à falta de jeito.
Amo porque essa é a história que eu tenho. Essa é a escolha que eu honro.
E espero que, algum dia, ele possa olhar para si mesmo assim também.
Até lá, deixo aqui uma figurinha para lembrá-lo disso.
Que faça bom uso.
🥰 A minha primeira zine fala sobre isso. Quase usei um trecho dela como citação.
😍 Amo Marc Chagall, amo ver fazer arte em vidro; por isso, amei demais esse vídeo!
🤗 A postura é essa!
🤤 Ah pronto! Mais um pra lista de desejos.
🤩 Isso é tãããão relaxante! E fica lindo assim…
E se você gosta do meu trabalho e quer apoiá-lo, você pode:
Comprar uma das minhas zines clicando aqui.
Indicar esta news a alguém que você queira bem.
Acompanhar meus textos pelo perfil do Instagram.
Enviar um pix de qualquer valor para vinicius.linne@gmail.com.
Bombou no Insta esta semana:
se estivermos em paz com todas as nossas versões, ninguém é capaz de nos desassossegar.